segunda-feira, junho 26, 2006

ENTREVISTA JORGE NUNES, PRESIDENTE DO CONSELHO DE ARBITRAGEM DA ASSOCIAÇÃO DE FUTEBOL DE CASTELO BRANCO


“O árbitro é sempre o elo mais fraco”

É a grande entrevista do presidente do Conselho de Arbitragem da Associação de Futebol de Castelo Branco. Em jeito de balanço da temporada que agora foi encerrada, Jorge Nunes fala sobre os temas quentes da arbitragem, não só no plano distrital mas também num âmbito mais alargado. Para dentro deixa o conselho aos árbitros que “têm que trabalhar sempre mais”, e para fora transmite as dificuldades que é estar por dentro do mundo dos senhores do apito.

“Os árbitros têm que trabalhar, estudar e têm que se empenhar”

Tribuna Desportiva- Qual é o balanço que faz da temporada que agora terminou, em termos distritais?
Jorge Nunes- Tendo em conta as condições de que nós dispomos e a exigência que esta actividade transporta o balanço é extremamente positivo.
TD- A nível nacional as coisas não correram assim tão bem, e os resultados finais foram maus, especialmente no futsal…
JN- Sim… No futsal tivemos a surpresa pela negativa, porque os árbitros de 2ª categoria desceram à 3ª e o único elemento que nós tínhamos de 3ª desceu ao distrital. No futebol de 11 tivemos a descida do Bruno Nave, que foi compensada pela subida do João Brás, da mesma forma que, no futsal subiu o Izaldo Barata. A nível nacional as exigências são maiores e daí a nossa mensagem de uma forma insistente para que o trabalho seja maior. A questão das bonificações nas reciclagens é a constatação de que, quem bonifica nas reciclagens, ou seja, quem faz mais de 90 pontos no teste escrito, tem bonificação de .15, quer dizer que quem bonifica duas vezes tem .30 acumulados no fim da época em termos de média classificativa. A experiência que nós temos, e o que é uma realidade é que uma variação de .15 ou .30 implica directamente na classificação, em termos médios, ou 10 ou 20 lugares. Quer dizer que os árbitros têm que se começar a preparar nas reciclagens antes de começarem os campeonatos. Qualquer árbitro que bonifique fica, à partida, 10 lugares acima daquele árbitro que não bonifica. E a mesma coisa se passa na 2ª reciclagem. O que nós dizemos de uma forma continuada aos árbitros é que eles têm que trabalhar. Têm que estudar, têm que se empenhar e têm que pôr em prática as condições que nós lhes pomos à disposição.
TD- Como é que entende as palavras do sr Luciano de Almeida quando ele diz que os árbitros não correspondem ao esforço feito pelo Conselho de Arbitragem?
JN- Essa crítica do sr Luciano entronca naquilo que é uma realidade. O Conselho de Arbitragem tem tido sempre à disposição todas as condições que pede à Direcção da Associação. E a Direcção sabe o trabalho que nós desenvolvemos, sabe do empenhamento e sabe aquilo que nós lutamos para que os árbitros, tanto a nível distrital como nacional, tenham o melhor desempenho possível. É natural que tanto a Direcção da AFCB como o Conselho de Arbitragem fiquem tristes com os resultados finais das classificações, porque, se um árbitro de Portalegre, de Évora, de Viseu ou da Guarda consegue bonificar os nossos também têm que atingir esses patamares. Daí por vezes alguma desilusão quando olhamos para as classificações. Mas eu penso que a crítica tem que ser encarada pela positiva.

“Por vezes, as classificações dos árbitros dependem
do critério largo ou apertado dos observadores”

TD- Porque é que não aparecem outros Carlos Xistra no nosso distrito?
JN- Nós, há três anos tínhamos 7 árbitros na Federação, neste momento temos 10. Eu contava este ano ter ficado com 12. Não é fácil chegar à Liga como árbitro e também não é tão fácil como parece subir de divisão, da 3ª para a 2ª categoria. Para a 1ª categoria sobem 3 ou 4 árbitros, em função de alguma saída por limite de idade ou por algum pedido de licenciamento e da 3ª para a 2ª categoria só sobem 10 num universo de 140. Temos que ter consciência que há árbitros melhores, mas também temos que ter consciência que às vezes há algumas injustiças nas classificações. Não quero dizer que não haja transparência mas o critério dos observadores, por vezes não é uniforme. Nós temos observadores que têm um critério mais apertado, outros mais largo, e a classificação do próprio árbitro pode variar segundo esse critério.
TD- No plano distrital, porque é que acha que o jovem árbitro Tiago Gomes fez as declarações conhecidas na última semana?
JN- Penso que só ele é que poderá pronunciar-se sobre o intuito e o conteúdo da entrevista. O conteúdo não é agradável, merece ser analisado, merece ir ao órgão competente para ser julgado em termos de justiça desportiva, mas penso que ele manifesta com alguma fragilidade a opinião dele e, aquilo que nós temos que fazer, é criar as condições para ele, concretizar a opinião que tem, e a pessoa ou pessoas implicadas poder-se defender também daquilo que de alguma forma possa ser acusado. Mas nisto, como em todas as profissões, uns reagem de uma maneira, outros reagem doutra, mas nós vivemos num estado de liberdade e todas as pessoas têm o direito de manifestar as suas opiniões e depois sujeitar-se às consequências.
TD- Mas ele acaba por elogiar o presidente do CA, mas diz que está mal acompanhado…
JN- A opinião que ele tem eu respeito. A minha opinião não é essa. O fenómeno da arbitragem é, por vezes, pouco compreendido, e tão menos compreendido pelos intervenientes directos, que é o caso do Tiago Gomes.
TD- Ele diz também que desconhecia que existia uma 2ª categoria nos árbitros de futsal e que não teve classificação porque nunca foi observado. Será que as coisas foram mal explicadas aos árbitros?
JN- Não foram nem bem nem mal explicadas. Nunca houve na vertente futsal 1ª e 2ª categorias. A exigência da Federação, quando nos pede árbitros para irem prestar provas, é que se reporta à admissão à 1ª categoria. Nós achamos que chegou a altura de classificar os árbitros de futsal a partir deste ano. Por isso chamámos os árbitros que só actuam no futsal para fazerem exames de acesso à 1ª categoria.
TD- Nesse aspecto desmente que o Tiago Gomes não tinha conhecimento dessa situação…
JN- O conhecimento é relativo. Até agora nunca tinha havido árbitros de 1ª e 2ª categoria de futsal, a partir deste ano entendemos que devia haver e foi por isso que os chamámos para fazer exames de acesso à 1ª categoria.

“Vamos reunir condições para reintegrar árbitros que,
por um motivo ou por outro, se afastaram nos últimos dois anos”

TD- Um dos problemas que afectou este ano a arbitragem, não só a distrital, mas também a nacional, foi a questão das fiscalidade. Como é que esse problema está a ser acompanhado pelo Conselho de Arbitragem?
JN- Eu penso que o problema da fiscalidade vai entroncar na Lei de Bases. É uma questão em que não há outra alternativa a não se quer que se criem algumas facilidades aos árbitros jovens ou à formação, porque este problema acontece, sobretudo, para os árbitros que ainda não têm uma profissão e para aqueles que são estudantes. Eu penso que nós temos condições, também por aquilo que aí vem em termos de legislação, de poder alterar as coisas para que não continuemos a perder árbitros que têm valor para continuar na arbitragem.
TD- E de alguma maneira podem voltar a chamar esses árbitros que se têm afastado?
JN- Eu penso que, para além do recrutamento normal de novos valores, uma das questões é fazer com que árbitros que já actuaram, e que não o fazem há um ano ou dois, voltem ao Conselho de Arbitragem, porque, à partida, estão melhor preparados do que aqueles que possamos formar agora, porque têm uma experiência maior. Penso que vamos reunir condições para reintegrar árbitros que deixaram de actuar por alguma razão, como por exemplo devido à fiscalidade.
TD- Referiu que é cada vez mais difícil captar novos árbitros. Porque é que isso acontece?
JN- É difícil porque a própria sociedade põe à disposição dos jovens outras atracções. É a prática desportiva, a vida académica também, mas eu penso que ser árbitro é uma questão de vocação e todo um conjunto de situações. Por vezes quem não é um bom praticante de futebol pode ter na arbitragem uma possibilidade de continuar a estar por dentro do fenómeno do futebol.

“Não podemos deixar que os árbitros adormeçam em relação ao trabalho”

TD- Acha que hoje em dia os árbitros ainda são vistos como os maus da fita dentro do teatro do futebol?
JN- Eu penso que, em certa medida, o árbitro é sempre o elo mais fraco. Isso vê-se tanto a nível distrital como a nível nacional. A nossa vontade é contrariar essa opinião porque aquilo que nós gostamos é que os árbitros sejam pessoas normais, nunca perdendo a ideia de que são árbitros, mas que, pelo facto de serem árbitros, têm que continuar a ter amigos. O que nós pedimos aos árbitros é que, quando são nomeados e quando cheguam aos campos que falem com as pessoas, cumprimentem os atletas e que estejam livres de qualquer sobrecarga pelo facto de irem apitar um jogo de futebol. O próprio árbitro tem obrigação de saber cativar os intervenientes no jogo.
TD- O seu trabalho como presidente do CA tem sido, de uma maneira geral elogiado. Está contente com o seu desempenho?
JN- Eu, em certa medida, estou contente com o trabalho. Mas também reconheço que os elogios que me são dirigidos, não só a mim mas ao Conselho de Arbitragem e à Associação, são o reconhecimento de um trabalho que se tem feito, mas temos que continuar a ser exigentes connosco próprios. Achamos que temos condições para fazer melhor porque damos aos árbitros condições para isso. Nós não podemos deixar que os árbitros, de uma forma normal, adormeçam em relação à questão do trabalho.
TD- Dirigiu-se à Comunicação Social fazendo o pedido para não ser tão critica em relação ao trabalho dos árbitros e para ser mais condescendente. Acha que a crítica também tem influência num bom ou mau trabalho de um árbitro?
JN- Eu acho que todo o árbitro tem que estar preparado para a crítica a que possa ser sujeitos. Aquilo que me parece é que, por vezes, a própria Comunicação Social, de uma forma naturalmente desinteressada, faz crítica justas ou injustas e isso faz com que, no próximo jogo, as pessoas intervenientes nesse jogo refiram sempre as críticas dirigidas ao árbitro na semana anterior. Queremos evitar que uma crítica seja transportada para o jogo seguinte. Daí o nosso pedido de uma forma sensível e objectiva e sem nenhum interesse, porque nós achamos que a Comunicação Social também tem um papel importante na melhoria da arbitragem e, sobretudo na transparência. Tem é que ser compreensível em relação a alguns erros que possam acontecer num campo de futebol.

Jorge Nunes na entrevista que põe ponto final à época 2005/06. O presidente do Conselho de Arbitragem do nosso distrito está contente com o desempenho do órgão a que preside mas também deixa a ideia de que é sempre possível fazer mais e melhor no capítulo do apito.

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