quarta-feira, janeiro 04, 2006

ENTREVISTA CARLOS PACHECO, TREINADOR DAS ESCOLINHAS PRÉ-COMPETIÇÃO DO DESPORTIVO CB


“Não interessa estar a formar Maradonas ou Figos”

Carlos Pacheco viveu muitos anos dentro das quatro linhas envergando a camisola do Desportivo de Alcains. Formado em Educação Física há dois anos que treina as escolinhas pré-competitivas do Desportivo de Castelo Branco. Não gosta de falar do futuro porque diz que “é tudo uma questão de oportunidade”. No início desta temporada foi convidado para treinar o Escalos de Baixo mas optou por continuar com os miúdos do Desportivo.

Tribuna Desportiva- Trabalhar com os miúdos das escolinhas dá-lhe um prazer especial?
Carlos Pacheco- Dá prazer porque tudo o que nós fazemos eles aprendem facilmente e depois no final de cada ano vemos que o trabalho que foi feito dá os seus frutos. Os miúdos quando vêm não têm defeitos nem nenhuns vícios, e tudo o que fazemos eles aprendem, e para além disso é a motivação, não só a minha como a deles. Eles andam a semana toda a pensar no dia em que têm treino e nós sentimos um enorme prazer nisso.
TD- O facto de trabalhar com os pré-competitivos e não com juvenis, ou mesmo seniores, é uma opção sua?
CP- Este ano foi. O ano passado não. Foi opção trabalhar com a pré-competição porque eu não queria trabalhar com miúdos da competição porque o ano passado, a nível de organização, o Desportivo não estava muito bem e havia sempre confusões de transportes, directores que não ajudavam porque não tinham disponibilidade, e então optei pela pré-competição onde, a nível de logística, não tínhamos tanto trabalho. Era eu sozinho, organizei as coisas à minha maneira, tive o apoio todo da Direcção e as coisas funcionaram bem. Este ano optei por ficar também com os pré-competitivos, apesar de quererem que eu ficasse com uma equipa na competição. Também fora do Desportivo houve oportunidade de trabalhar noutros clubes, mas eu entendi que devia continuar com este grupo e estou a sentir-me muito bem. Se as coisas continuarem assim, de certeza que no próximo ano optarei de novo por ficar com este grupo, até porque a nível de tempo permite-me estar mais tempo com a família.
TD- O número de clubes e o número de equipas nestes escalões tem vindo a aumentar de ano para ano, isso é sinal que vale a pena trabalhar na formação?
CP- Vale a pena porque os pais cada vez mais têm necessidade de ocupar os filhos. Toda a gente sabe que, hoje em dia, nos fins-de-semana principalmente, as crianças passam o tempo em casa a ver televisão ou a jogar consola ou computador. Então os pais aproveitam coisas novas para colocar os miúdos. E nós, como clubes da cidade, só temos que oferecer. Há a Casa do Benfica, o Benfica e Castelo Branco e depois nós com 50 miúdos e o Valongo com 40 ou 45 miúdos. Nós temos quantidade, qualidade de trabalho e de instalações, e a mensalidade é um valor irrisório. Os miúdos pagam 10 euros e se forem para o judo, para a natação ou para o ténis, pagam muito mais e, se calhar, o tempo de actividade é muito menor. Eu penso que os pais só têm que aproveitar a oferta dos clubes.
TD- E ver os miúdos a evoluir é, naturalmente, um prémio…
CP- Dá-me gosto ver que a equipa que subiu este ano para escolas C, que esteve comigo o ano passado. Os miúdos estão muito diferente daquilo que eram quando chegaram o ano passado. Este ano tenho a certeza que o grupo que vai subir para a competição também vai ter muita qualidade. Não importa estarmos a formar Maradonas ou Figos, o mais importante é manter os miúdos ocupados, ajudar no crescimento social deles e que possam aprender a saber estar com os colegas. O primeiro objectivo nem é ensinar-lhes a jogar futebol, mas sim ensinar-lhes a estar em conjunto. A partir daí, como estão a jogar uma coisa que gostam, juntamos o útil ao agradável e eu estou super contente com o trabalho que está a ser desenvolvido.
TD- Parece-me é que este trabalho não é bem recompensado quando mais tarde um destes miúdos acaba por sair para um clube com outras dimensões…
CP- As coisas hoje em dia estão a mudar nesse aspecto. Nós no Desportivo temos colegas que, felizmente, têm contactos tanto com o Benfica como com o Sporting e regularmente levam lá jogadores que possam ter qualidade a treinar a esses clubes. É lógico que a recompensa nunca é a que nós desejaríamos, mas é o que está estabelecido pela Federação. Nós só temos que respeitar. Temos é que pensar bem se compensa levar um miúdo que é infantil ou iniciado para o Benfica ou para o Sporting, porque hoje em dia a quantidade de miúdos que aparece é cada vez maior. O ir ao Benfica ou ao Sporting não é sinal que já têm um futuro assegurado. Antigamente é que era assim. Quem ia para o Benfica ou para o Sporting normalmente tinha uma saída no futebol. Agora já não é assim porque há muita oferta e vão lá muitos miúdos de todo o país. O Benfica e o Sporting cada vez mais estão organizados para ter olheiros em todo o lado, e hoje em dia vale mais pensar se não é melhor os miúdos continuarem aqui connosco, porque nós já trabalhamos bem, e depois em juvenis ou juniores, se os miúdos têm de facto qualidade, apostar em ir para esses clubes. Em termos de compensações, para quem recebe é sempre pouco, porque nós estamos aqui uma série de anos a formar jogadores e depois vão-se embora. Quando eles não vão para esses grandes clubes, mas vão para outros clubes só porque estão nos nacionais, aí é que ficamos tristes. Ainda o ano passado tivemos um caso desses. Tivemos aí jogadores connosco 5 e 6 anos a aprender, aquilo que eles eram como jogadores deviam ao Desportivo, e depois foram para o Benfica e Castelo Branco porque estava no Nacional. O Desportivo ficou praticamente sem nenhum a compensação e isso deixa-nos tristes. Se é para realização pessoal e se vão à procura de algo que é melhor, aí temos que ter em atenção e ver as ambições de cada um.
TD- A médio, longo prazo, vai continuar com este trabalho ou pensa em trabalhar com seniores?
CP- Isto é tudo uma questão de oportunidades e de ofertas que surjam. Eu não gosto de pensar a longo prazo e pensar no que vou fazer daqui a 2 ou 3 anos. No início deste ano surgiu-me a possibilidade de trabalhar nos Escalos de Baixo. Não me agradou, não a proposta, mas sim o timing em que o convite foi feito. Na altura não havia as condições que eu considerava serem as mínimas. Eu sei que estou no início de carreira, que ainda não dei provas, e que não posso exigir muito, mas pelo menos o mínimo de condições tenho que exigir. No final da época vamos ver o que surge. Posso chegar à conclusão que o melhor é continuar com o grupo que vai agora subir a escolinhas e levá-los até aos juniores… Posso sair para um plantel sénior ou para ir ajudar alguém… A vantagem de estar na pré-competição é que não tenho planos a longo prazo. Todos os anos trabalho com uma equipa e não há aquela preocupação de saber que já estou com eles há 2 ou 3 anos.
Vive a vida a cada momento e não pensa muito no futuro. O presente é o que conta e Carlos Pacheco é o treinador dos miúdos do Desportivo albicastrense na antecâmara da competição.

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